Marcadores

terça-feira, 8 de junho de 2010

Dia dos Namorados

O Dia dos Namorados está chegando! Para muitos é uma data para ser esquecida, para dormir até bem tarde ou arrumar tanta coisa pra fazer que quando notar já será um dia normal outra vez. Eu sei, porque alguns anos foram assim. Tristes. Solitários. Mas isso me faz pensar o quanto estamos com valores trocados e como fomos intoxicados por preconceitos e medos que nos impedem de ser felizes. Eu conheço tanta gente maravilhosa, mulheres lindas, inteligentes, responsáveis, independentes e sozinhas. E sozinhas com aquele plus: porque quer. E como conheço caras bacanas, que ao contrário do que a sociedade impôs, não são canalhas-sacanas. São homens simples, sinceros, honestos e muito inseguros mas que também querem alguém pra vida toda. E agora as coisas estão assim: um diz que o outro é que não quer nada com nada e ambos ficam mesmo é de corações vazios e Dias dos Namorados solitários. Eu aprendi uma coisa e que mudou a minha vida: para encontrar um amor, é preciso abrir o coração, acreditar que existe mais gente tão bacana quanto você, não ter medo de ser quem você é e aceitar que ninguém é perfeito. Algumas vezes eu sonhei com aquele romântismo de jantar à luz de velas e declarações eternas de amor, hoje, eu só quero poder olhar pra ele e poder sentir aquela gratidão inexplicável de ser amada e de poder amar. E deixo um texto de Carlos Drummond de Andrade, que me acompanhou escrito numa folha de caderno amarelo quase que pela vida inteira e que hoje eu me desfaço.

TER OU NÃO TER NAMORADO
(Carlos Drummond de Andrade)

Quem não tem namorado é alguém que tirou férias não remuneradas de si mesmo. Namorado é a mais difícil das conquistas. Difícil porque namorado de verdade é muito raro. Necessita de adivinhação, de pele, saliva, lágrima, nuvem, quindim, brisa ou filosofia. Paquera, gabiru, flerte, caso, transa, envolvimento, até paixão, é fácil. Mas namorado, mesmo, é muito difícil. Namorado não precisa ser o mais bonito, mas ser aquele a quem se quer proteger e quando se chega ao lado dele a gente treme, sua frio e quase desmaia pedindo proteção. A proteção não precisa ser parruda, decidida; ou bandoleira basta um olhar de compreensão ou mesmo de aflição. Quem não tem namorado é quem não tem amor é quem não sabe o gosto de namorar. Há quem não sabe o gosto de namorar. Se você tem três pretendentes, dois paqueras, um envolvimento e dois amantes; mesmo assim pode não ter nenhum namorado.
 
Não tem namorado quem não sabe o gosto de chuva, cinema sessão das duas, medo do pai, sanduíche de padaria ou drible no trabalho. Não tem namorado quem transa sem carinho, quem se acaricia sem vontade de virar sorvete ou lagartixa e quem ama sem alegria. Não tem namorado quem faz pacto de amor apenas com a infelicidade. Namorar é fazer pactos com a felicidade ainda que rápida, escondida, fugidia ou impossível de durar. Não tem namorado quem não sabe o valor de mãos dadas; de carinho escondido na hora em que passa o filme; de flor catada no muro e entregue de repente; de poesia de Fernando Pessoa, Vinícius de Moraes ou Chico Buarque lida bem devagar; de gargalhada quando fala junto ou descobre meia rasgada; de ânsia enorme de viajar junto para a Escócia ou mesmo de metrô, bonde, nuvem, cavalo alado, tapete mágico ou foguete interplanetário.
 
Não tem namorado quem não gosta de dormir agarrado, de fazer cesta abraçado, fazer compra junto. Não tem namorado quem não gosta de falar do próprio amor, nem de ficar horas e horas olhando o mistério do outro dentro dos olhos dele, abobalhados de alegria pela lucidez do amor. Não tem namorado quem não redescobre a criança própria e a do amado e sai com ela para parques, fliperamas, beira - d'água, show do Milton Nascimento, bosques enluarados, ruas de sonhos ou musical da Metro. Não tem namorado quem não tem música secreta com ele, quem não dedica livros, quem não recorta artigos; quem gosta sem curtir; quem curte sem aprofundar. Não tem namorado quem nunca sentiu o gosto de ser lembrado de repente no fim de semana, na madrugada, ou meio-dia do dia de sol em plena praia cheia de rivais. Não tem namorado quem ama sem se dedicar; quem namora sem brincar; quem vive cheio de obrigações; quem faz sexo sem esperar o outro ir junto com ele. Não tem namorado quem confunde solidão com ficar sozinho e em paz. Não tem namorado quem não fala sozinho, não ri de si mesmo e quem tem medo de ser afetivo.
 
Se você não tem namorado porque não descobriu que o amor é alegre e você vive pesando duzentos quilos de grilos e medos, ponha a saia mais leve, aquela de chita e passeie de mãos dadas com o ar. Enfeite-se com margaridas e ternuras e escove a alma com leves fricções de esperança. De alma escovada e coração estouvado, saia do quintal de si mesmo e descubra o próprio jardim. Acorde com gosto de caqui e sorria lírios para quem passe debaixo de sua janela. Ponha intenções de quermesse em seus olhos e beba licor de contos de fada. Ande como se o chão estivesse repleto de sons de flauta e do céu descesse uma névoa de borboletas, cada qual trazendo uma pérola falante a dizer frases sutis e palavras de galanteria.
Se você não tem namorado é porque ainda não enlouqueceu aquele pouquinho necessário a fazer a vida parar e de repente parecer que faz sentido. 
ENLOU-CRESÇA.
[Dani Arruda]



Nenhum comentário: